segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

OS ANOS 80


Lisboa - 1984 - 1993

Os gestos da terra


Solicitude, 78 x 45; A Mão Gruta, 78 x 40; Arvorescência, 78 x 45, 1989, Têmpera sobre cartão prensado

As formas do invólucro que cinge as mãos, as luvas que as ornamentaram ou protegeram, a mão ainda na sua memória deitada por terra, memória deitada por terra e envolta em lama, poeira agora que já seca, autonomizando-se e guardando a saudade do gesto do que foi: outra coisa bem diferente. Gestos da terra em tudo que podem ter de específico, como se sabe que esses gestos têm de familiar estranheza e de telúrico. Os gestos da terra declamam essa poética de enaltecimento do estranho familiar, intimista pelo seu modo de expressão e escala gráfica, exigindo proximidade no modo de ver. É o caminho percorrido por formas vislumbradas no real imaginário do movimento do lápis sobre o papel, quase sempre roçando o virtuosismo técnico e demonstrando que o risco pode criar imagens deslumbradas, porventura ascéticas na sua formulação e expressão, mas deslumbradas na magia do inventado.


 
A Estela, 1987, Lápis sobre papel, 80 x 70                                                                   Dança Nupcial, Lápis sobre papel, 48 x 36



 São figuras introvertidas. Não se situam no campo: não têm qualquer tipo de relação com a envolvente. Estão sobre uma página branca, sem mais. Fechadas sobre elas mesmas, ignoram tudo quanto as rodeia. O gesto fecha-se de modo autista. O gesto da terra é um retorno. Vai-se da rigidez de uma qualquer Petridade à fingida moleza da Florescência. O rendilhado de a Estela ou de o Retorno contrapõe-se à firmesa afirmativa de a Dança Nupcial e à leveza dos esboços. Depois, subitamente, será a violência expressiva de os últimos trabalhos da série, realizados a têmpera sobre cartão (Solicitude, A Mão Gruta, Arvorescência).






A Coroa do Rei, 1986, Lápis sobre papel, 70 x 80








O Retorno, 1989,. Lápis sobre papel, 40 x 60


A Teia, 1989, Lápis sobre papel,48 x 36

Florescência, 1987, Lápis sobre papel, 35 x 30

É uma época de desenho a lápis no reconhecimento da nobreza desse meio técnico que, suscinto na   expressão, nada escamoteia e tudo permite. De grande riqueza melódica como que espaça os tons, definindo com precisão a melodia e salientando toda e qualquer eventual cacofonia. É de uma exigência enorme e de um grande potencial expressivo. Os Gestos da Terra foram em busca de isso mesmo.

Petridade, 1989, Lápis sobre papel, 50 x 40